Para Elas...

Naquela altura não passávamos de miúdas, o mundo era estranho (ainda é) e o Kurt cobain era vivo. Tínhamos as nossas paixões assolapadas mas nunca gostamos dos mesmos rapazes, já sabíamos que o mais importante éramos nós, as melhores amigas do mundo inteiro. Eu era a miúda que gostava de caminhar pela linha do comboio, deixar pedras nos carris e equilibrar-me ao longo do caminho - vocês já não achavam tanta piada a isso, às vezes zangávamo-nos, mas éramos atinadas. Tínhamos boas notas sem estudar muito, (sem estudar nada). As vezes íamos para a varanda da Margarida estudar, pois sim...Comprávamos as nossas revistas parvas, a Super PoP, a Bravo e mais tarde quando já nos achávamos “grandes” , a ragazza [eu sei que ainda a compras sara, mas não conto a ninguém;)].
A viagem a Paris, momento “fatídico” nas nossas vidas, vivemos com intensidade aqueles dias passados na cidade luz, chorámos, chorámos tanto no abraço umas das outras lembram-se? Quiseram-nos separar, e por algum tempo acreditei que conseguiam. Traímo-nos umas às outras, estúpidas!! A Sarah num grupo diferente, eu e os rapazes, a margarida e as miúdas da turma C...morri de ciúme e engoli-o para não perceberem que me afectava, que me irritava andarem de um lado para o outro como se fossem as melhores amigas, mas não eram e quando nos apercebemos voltamos para nós, chorámos outra vez e perguntámo-nos meio a rir, meio a medo, se aos dezoito ainda íamos ser amigas. Que disparate. Claro que sim...Nem tudo foi mau, tínhamos um quarto só nosso onde queimávamos incenso a toda a hora, tínhamos os cremes, vernizes espalhados na mesa encostada a janela com vista “pour lá université” e no armariozinho ao lado, as bolachas que todas as noites eram motivo de saques...e por mais anos que passem nunca me hei-de esquecer daquela noite em que uma febre esquisita não me deixou dormir e tu mana, ainda que perdida de sono, passas-te a noite do meu lado a pôr-me panos frescos na testa para a febre baixar -um gesto de amizade comparável ao segurar a testa de alguém quando vomita. Quiseram-nos separar e ”virou-se o feitiço contra o feiticeiro” (se tivesse algum provérbio preferido seria este).
Depois da viagem, vieram os anos do Edson e a minha primeira saída para Almada velha, o Manecas, a Tasca do cão e mais tarde a Cerca da noite, noites longas que lá passávamos. Os namorados, os flirts...As incursões a Lisboa e as varandas dos cacilheiros no por-do-sol. O karaoke na casa da margarida (guarda bem essa cassete esteja ela onde estiver, pode ser a nossa desgraça). O primeiro cigarro no sótão, as t shirts compridas do Mário que usávamos para disfarçar o cheiro , eu ria-me porque isso não tirava o cheiro dos dedos e gozámos muito porque afinal, aquilo não fazia tossir (só Á Sarinha, vais-me odiar depois disto lol). Depois corríamos para o elevador, mas antes escondíamos o maço entre as telhas do telhado com medo de ser descoberto e desconfio que ainda lá esteja...E desse primeiro cigarro, as primeiras tonturas, os nossos grandes desatinos, outras descobertas ainda menos salutares. Os caminhos, minhas amigas, andaram separados, cada uma seguiu o seu caminho como tinha de ser, mas sempre, sempre, sempre, bem cá no fundo, estavam ( estão) vocês. Sempre foi para vocês que regressei, sabem disso. Foram sempre vossos os primeiros braços que procurei a cada regresso. A cada pedaço de coração partido. A cada partida. Partilharam (e partilham) tudo comigo e eu com vocês.
Hoje, olho para vocês passados estes anos, que nem foram assim tantos (mas os suficientes para encher de recordações uma caixa de sapatos forrada a papel de lustro com borboletas) , e tenho orgulho das pessoas bonitas que se tornaram. Continuam a ser vocês, confidentes, amigas, irmãs. O que sentimos não se compara a nada no mundo, sempre dissemos que bastava uma de nós ser do sexo oposto para estarmos casadas e é mesmo assim, mesmo assim. Os laços que nos unem são mais fortes que qualquer outro, os vossos namorados sempre o souberam, os meus também, nunca pudemos gostar deles com tanta força. Ninguém entende os meus silêncios como vocês, ninguém entende os vossos abraços como eu...


Desculpem-me a repetição, mas elas merecem.

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