Em movimento...


15 horas e 53 minutos, o comboio parte e a paisagem corre lá fora ritmada com o som metálico dos carris enferrujados: arvores, arvores, arvores, fios eléctricos, fios eléctricos, chaminés, fios eléctricos, arvores pouca terra, pouca terra, azul, azul, rio azul (não é o meu mas começo já a gostar dele)...Praias do Sado é a primeira paragem e a minha segunda casa. Há quase um mês que aqui estou, e dos meus (tão adorados) rituais já faz parte andar de comboio. Acordo cedo, e às vezes, muitas vezes o sol esconde-se ainda no horizonte quando me sento no andar de cima da penúltima carruagem. E se Setúbal é a minha segunda casa, o comboio é a terceira, mas não me custa, nada me custa quando me lembro que é para lá que vou....e todos os dias, quando me sento novamente com eles, os futuros fisioterapeutas (como eu) , enfermeiros, terapeutas da fala no andar de cima da penúltima carruagem de regresso a casa é mais o que partilhamos uns com os outros, é mais o que aprendemos, e cada vez aprendemos mais , e cada vez queremos aprender mais e mais, temos fome, sede de saber.
Mas desta vez o comboio é outro, não há ar condicionado nem música clássica e desconfio que nem chão, mas nada disso importa, vou ter com ele ,é tudo o que eu quero. Não o vejo há uns dias, nunca sei quantos (não gosto de contagens) mas sei que senão são muitos, são os suficientes para me enfiar no comboio fantasma que vai para o Barreiro e esquecer-me do resto do mundo à medida que as praias do Sado vão ficando para traz. A viagem é agradável (mas lenta), vou observando detalhadamente cada uma das pessoas que entram e saem da carruagem, um olhar quase clinico sobre a forma como se movimentam numa tentativa de aplicação da última aula de “estudos do movimento humano”. A janela é outro escape à ansiedade que tento enganar. Do lado de lá vejo uma paragem, acho que a penúltima, (já falta pouco). No chão, carris enferrujados por todo o lado e ao fundo, um velho vagão estacionado em jeito de fotografia a Sépia tirada há já muito tempo.
16 horas e 40 minutos, o comboio pára : É tarde de outono na marginal barreirense e primavera na minha pele...*.

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