Não te posso dizer o que me atravessa a mente quando o mar me invade os olhos e as narinas e os ouvidos. Com a água salgada vem tudo o que as palavras não conseguem agrupar em frases.
É o mundo inteiro, o que existe contigo e o outro também, é o que vem e o que vai, é um barco e um gira-discos, o que me prometeste e o que me prometi a mim também. És tu e sou eu, somos os dois e o que não fomos e o que se calhar nunca vamos ser. É o achar-te diferente de mim num segundo e ver-te tão igual e tão entranhado no outro. É o sermos livres e termo-nos um ao outro e pensar para mim “nunca fui livre, sempre fui tua estupido, estivesse onde estivesse, com quem fosse, a fazer seja o que for. Não há nada que dilua a tua presença em tudo o que faço, mesmo nao sabendo onde andas, com quem andas, não preciso de saber nada disso, só que estou contigo e isso chega-me . A tua vida para lá dos meus muros só a ti pertence e eu confio em ti, apesar do que dizes e do que aparento”. E eu não te vou dizer isto tudo, porque “há coisas que não digo, mas nunca esqueço”.
Aperto-te a mão com força, tenho grãos de areia entre os dedos que arranham os maus pensamentos.
Aliso o chão ao lado da tua perna com a palma da mão, penso no quanto gostaria que a vida te fosse lisa, e o mar continua no seu encadeamento, vem à frente, volta atrás e respira fundo, avança mais um bocadinho.
Bem vistas as coisas, é o que nós fazemos também, não é? olha bem e diz-me se não tenho razão, andamos para trás um bocadinho e sempre que recuamos, ganhamos balanço para sermos maré cheia, nem que seja por um momento pequeno. A saber eu que esse momento volta, não me importo de vazar vezes e vezes sem conta.